REMÉDIOS PSIQUIÁTRICOS: TOMAR OU NÃO?

A saúde mental sempre foi tratada como um tabu e diversos preconceitos ainda permeiam o assunto. Os estigmas vão desde a associação à incapacidade produtiva do sujeito que apresentasse algum transtorno (comumente e por longo período dentro da história da saúde mental, nomeado como louco), até julgamentos de ordem religiosa, acusando falta de fé, fraqueza ou rotulações afins. Embora continue havendo muitas distorções e receios em tratar o problema de forma direta e positiva, não podemos negar que nos últimos anos, tornou-se mais frequente ouvir falar sobre alguns transtornos, especialmente, sobre ansiedade, pânico e depressão. Com a incidência dessas alterações da saúde mental mais diagnosticadas e comentadas em meio à população geral, é concebível compreender que as pessoas anseiem mais por disponibilização dos antídotos para tais problemas com maior aceitação. Isso não significa que não haja a necessidade de avançar muito em conscientização, informação e acesso à saúde mental, mas é válido ressaltar que se notifica o aumento do número de pessoas que buscam ajuda profissional e consideram o uso de remédios psiquiátricos últimos tempos, com ênfase desse comportamento após a pandemia. No entanto, a questão que surge é: devemos tomar esses medicamentos ou não?
Comumente, vemos o receio de alguns pacientes que recebem prescrição médica para uso de remédios psicotrópicos, alegando medo de ficarem dependentes ou temer conviver com efeitos colaterais, negligenciando assim os cuidados com a saúde mental. Por outro lado, há também um grande número de pessoas que banalizam a utilização de medicação, fazendo uso indevido, irregular e até mesmo, consumindo fármacos de familiares e amigos, sem a devida prescrição ao seu próprio quadro clínico. Esses comportamentos antagônicos sinalizam a necessidade em falar de forma mais ampla e em diversos espaços sobre a saúde mental, bem como clarificar à população os benefícios dos medicamentos psiquiátricos, assim como os da banalização e perigos da automedicação.
OS DOIS LADOS DA MOEDA
É inegável que os remédios psiquiátricos têm benefícios significativos para muitos pacientes. Eles podem ser prescritos apenas por médicos e servem para tratar uma variedade de condições clínicas no campo da saúde mental, incluindo depressão, ansiedade, transtorno bipolar, borderline, esquizofrenia, entre outros. Considerando que os transtornos psiquiátricos podem desregular os neurotransmissores e isso trazer consequências danosas à vida funcional do paciente, esses medicamentos podem ajudar a manter a qualidade de vida de indivíduos que sofrem dessas condições.
Assim, medicações agem diretamente na dinâmica biológica do corpo e isso, ameniza sintomas cognitivos e emocionais. Entretanto, se tratando de questões de saúde mental, não basta tratar os sintomas de forma unilateral, mas é de suma importância que o paciente consiga compreender e enfrentar demandas subjetivas/emocionais que muitas vezes agem como gatilhos para desencadear quadros específicos. Aqui, entra o importante trabalho da psicoterapia, que ajuda o paciente a desenvolver recursos de enfrentamento mais assertivos e aumentar a imunidade emocional.
Dependendo do quadro e da complexidade de cada caso, pode haver situações em que um paciente necessite usar alguma medicação de forma contínua e ininterrupta. Em outros casos, após um período de tratamento, já é possível suspender o uso dos psicofármacos. Esses prognósticos não devem ser adotados de forma aleatória, mas sempre orientados por profissionais competentes e especializados nessa área, a saber, psicólogos e médicos (preferencialmente psiquiatras), lembrando que somente este último tem autorização legal para intervir na prescrição farmacológica. Porém, pode ocorrer (e inclusive costuma ser bastante produtivo) que esses profissionais trabalhem de forma consoante e em parceria, para melhores resultados na evolução do quadro do paciente.
Fica clara a relevância e contribuição da ciência, produzindo medicações cada vez mais modernas e eficazes no tratamento da saúde mental, que podem, juntamente com a psicoterapia, trazer benefícios indiscutíveis à qualidade de vida das pessoas que sofrem com transtornos psiquiátricos. No entanto, a banalização do uso desses remédios é um problema preocupante. Muitas vezes, as pessoas estão procurando soluções rápidas e fáceis para seus problemas emocionais, sem considerar outras abordagens terapêuticas, como a psicoterapia, assim como a adoção de novos hábitos de vida e outras intervenções que exigem a participação ativa do paciente. A medicação psiquiátrica deve ser vista como parte de um tratamento mais amplo, que inclui avaliação profissional, acompanhamento regular e um plano de cuidados abrangente. Apenas tomar remédios sem o devido acompanhamento pode resultar em efeitos colaterais e até mesmo agravar os sintomas em alguns casos.
ALERTA IMPORTANTE SOBRE A AUTOMEDICAÇÃO
Infelizmente, essa é uma prática muito comum em meio aos brasileiros, mas, nem por isso, pouco perigosa. Em 2020, o Ministério da Saúde divulgou dados que mostravam um aumento no número de internações por transtornos psicológicos e comportamentais no Brasil. Essa realidade sugere que há uma demanda crescente por tratamentos, incluindo o uso de remédios psiquiátricos.
A priori, a prescrição de fármacos para problemas de saúde mental são, em sua maioria, controlados e só podem ser vendidos mediante receitas médicas. Apesar desse cuidado regulado pela ANVISA, muitos pacientes acabam fazendo uso desses remédios psiquiátricos sem a devida prescrição (com acesso/administração irregular), baseando-se em sintomas autodiagnosticados ou na influência de outras pessoas. Isso pode levar a complicações graves, pois esses medicamentos têm efeitos específicos no cérebro. A automedicação também pode mascarar condições subjacentes e retardar o diagnóstico e tratamento adequado. Portanto, reiteramos a importância que o acompanhamento dos quadros de saúde mental sejam realizados por especialistas, já que são profissionais preparados para avaliar a real necessidade da medicação, considerando o histórico do paciente, sintomas apresentados, além de terem amplo conhecimento dos princípios psicoativos no organismo e do quanto eles são viáveis na relação custo benefício da saúde geral do paciente.
QUANDO PROCURAR UM PSICÓLOGO OU PSIQUIATRA
Diversos sinais podem indicar a necessidade de buscar o acompanhamento de um profissional da saúde mental. Em alguns casos, contextos muito pontuais, como eventos traumáticos, lutos ou adversidades bastante específicas podem desencadear sofrimento psíquico significativo e que, sendo negligenciado, aumentam o risco de gerar danos maiores.
Há também situações que não são tão claras para o paciente, mas que tanto ele próprio, quanto pessoas de sua convivência podem perceber sintomas atípicos do padrão de comportamento, ou ainda, comportamentos corriqueiros, mas que afetam a vida funcional, tenha frequência e/ou intensidade que prejudique o indivíduo ou causem sofrimento/problemas no relacionamento com outras pessoas.
Buscar ajuda não é sinônimo de fraqueza e a ciência tem por função, servir e melhorar a qualidade de vida das pessoas. Ter saúde mental não é um capricho, mas sim, um direito de todos.
Simone Rezende Barbosa Pereira
Psicóloga – CRP 18 03334